Na
 quarta-feira, no horário do almoço, enquanto uma multidão de gente 
passava apressada pela estação de metrô Liverpool Street, Jay Carver 
examinava uma funda escavação onde apareciam um crânio e os ossos de 
várias pessoas desconhecidas.
Esses restos mortais são os mais recentes achados de cerca de 400 
esqueletos que Carver e sua equipe descobriram nesse local, onde ele 
espera encontrar ainda vários milhares. Os ossos fazem parte de uma vala
 comum, um grande cemitério do século XVII que está sendo descoberto 
graças à construção de uma nova linha de trem que vai passar através do 
centro da cidade, disse Carver, o arqueólogo-chefe do projeto.
A chamada rota Crossrail, com 
inauguração prevista para 2018, vai atravessar o bairro londrino de West
 End,seguindo para leste até Canary Wharf e mais além. Com um custo de 
14,8 bilhões de libras esterlinas (US$ 22,7 bilhões) e incluindo 50 
quilômetros de novos túneis, é o maior projeto de construção da Europa.
É também uma das maiores escavações arqueológicas do Reino Unido. Ao 
atravessar Londres, está revelando partes da história da capital, de 
cemitérios medievais a ruínas romanas, e até mesmo evidências de que o 
homem pré-histórico habitava a área. Muitas das descobertas irão para o 
arquivo e o centro de pesquisas do Museu de Arqueologia de Londres — 
iniciando também uma corrida para encontrar um lugar adequado para 
trasladar os restos humanos.
"Ele [o trecho ferroviário] está acrescentando mais detalhes e novas 
histórias" ao que já sabíamos sobre o nosso passado, disse Carver, que 
tem 46 anos. A equipe descobriu recentemente o primeiro objeto de ouro 
do projeto, uma moeda cunhada em Veneza no início do século XVI, que 
fora perfurada e provavelmente usada como pingente, mas que deve ter se 
perdido em meio ao lixo despejado no local que hoje é a Liverpool 
Street.
Os objetos encontrados por essa iniciativa arqueológica, que iniciou 
seus trabalhos no local há três anos, abrangem um vasto período. Entre 
os mais antigos: um pedaço de âmbar de 55 milhões de anos descoberto 
perto de Canary Wharf, no leste de Londres, e ossos de bisões e outros 
animais pré-históricos que se acredita terem 60.000 anos, encontrados em
 Paddington, na zona oeste.
Uma das últimas grandes descobertas comprova a elaboração de 
ferramentas de um tipo de pedra, desde o período Mesolítico até cerca de
 10.000 anos atrás. As lâminas e outros objetos feitos dessa pedra, 
encontrados nas últimas semanas perto do rio Tâmisa, revelam a atividade
 humana na área numa época em que a Inglaterra estava sendo repovoada 
após a Era do Gelo. As ferramentas provavelmente eram usadas por 
caçadores-coletores para pescar peixes com lanças, por exemplo, quando 
percorriam as terras pantanosas do Vale do Tâmisa, disse Carver.
Houve também uma série de descobertas importantes da Londres romana, 
cidade criada em meados do século I e que se acredita ser a origem de um
 assentamento permanente na área. Entre elas: um trecho de uma estrada 
romana feita de terra, argila e galhos de árvore, junto ao local que 
hoje é a estação de Liverpool Street, no distrito financeiro da capital 
inglesa, datando pelo menos do século II.
A equipe descobriu fundações de casas, cerâmicas e moedas, incluindo 
uma moeda de liga de cobre datando de 134 a 138 D.C., com a efígie do 
imperador Adriano, e um denário de prata de 220 a 225 D.C.. Também foram
 descobertas várias ferraduras da era romana, um tipo de sapato que 
cobria o casco inteiro do cavalo, e não a meia-lua metálica usada hoje. 
Presume-se que as ferraduras ficavam presas nos sulcos lamacentos da 
estrada e saíam das patas dos animais que seguiam por ali.
"É um belo instantâneo de uma ocorrência diária no transporte de 
mercadorias", diz Nicholas Elsden, do Museu de Arqueologia de Londres, 
que trabalha como gerente de projetos da Crossrail na obra de Liverpool 
Street.
Uma das descobertas mais destacadas foi a de uma vala que se acredita
 ter sido um cemitério em massa para vítimas da peste bubônica, logo ao 
norte das muralhas medievais da cidade, em Charterhouse Square. Sabe-se 
que a área foi usada para enterros desde 1348, quando a peste se 
espalhou rapidamente por toda a Europa e dizimou até um terço ou mais da
 população da Grã-Bretanha. Não há risco para a saúde em desenterrar os 
ossos agora, pois as bactérias que, segundo se acredita, causaram a 
peste só podem sobreviver no solo por algumas semanas e os corpos foram 
enterrados há séculos, disse Carver.
Embora existam alguns registros escritos sugerindo que dezenas de 
milhares de pessoas podem ter sido enterradas ali no espaço de alguns 
anos, não há registros anteriores de descobertas de ossos, segundo 
Carver. Ele e sua equipe descobriram cerca de 23 esqueletos no início 
deste ano, quando um poço de cinco metros de diâmetro foi cavado no 
gramado da praça.
Embora ele ainda esteja aguardando os resultados dos testes que 
confirmarão as datas e o que causou as mortes, Carver diz que os objetos
 de cerâmica encontrados no local indicam uma data em torno de 1350, e 
que há outros indícios que sugerem que as pessoas foram vítimas da 
peste.
A cerca de um quilômetro e meio para leste, em Liverpool Street, os 
esqueletos que estão sendo desenterrados jazem num local pertencente ao 
Hospital Bethlehem, asilo para doentes mentais que também ficou 
conhecido como Bedlam — de onde vem a palavra inglesa que significa 
tumulto ou confusão. Os registros históricos sugerem que 15.000 pessoas 
ou mais foram enterradas ali ao longo de um período de cerca de 150 
anos.
Na quarta-feira, enquanto os arqueólogos trabalhavam com cuidado para
 desenterrar o último desvão onde se encontravam ossos, Carver disse que
 espera achar dezenas de esqueletos prensados de maneira compacta nesse 
buraco de um metro quadrado, em seu trabalho inicial de escavação. Ele 
espera descobrir mais uns 3.000 esqueletos quando começarem as 
atividades arqueológicas mais intensas na obra de Liverpool Street, no 
final do próximo ano.
A maioria dos caixões está 
completamente corroída e há muito poucas lápides. Das poucas que podem 
ser lidas, uma parece pertencer a um bebê de alguns meses de idade 
chamado John Bail e outra a uma mulher chamada Sarah Long, ambos mortos 
no final do século XVII. Os registros sugerem que algumas celebridades 
podem estar entre os mortos, incluindo o herbalista Nicholas Culpeper.
Entre os muitos desafios para Carver e sua equipe está encontrar um 
local apropriado para um enterro nos dias de hoje, para onde seja 
possível transladar os esqueletos exumados. Ele diz ter recebido algumas
 queixas de pessoas preocupadas em não perturbar os mortos, pedindo que 
os corpos esqueletos sejam enterrados o mais rápido possível, e alguns 
especificamente pedindo um enterro cristão. Ele disse que a equipe está 
seguindo as exigências legais, que incluem ter uma licença para 
transferir os esqueletos, mas acrescentou: "É uma questão delicada".
Link:http://online.wsj.com/article/SB10001424127887324522504579001362127647086.html?mod=googlenews_wsj 

            
Nenhum comentário:
Postar um comentário