Quero hoje dividir com
vocês um trabalho que participei de Arqueologia Pública feito no
Colégio Aplicação em São Cristóvão, SE. A ideia desse post não
é só informar do trabalho que participei, caso fosse queridos não
seria Para Arkeólogos, minha intenção é dividir com vocês como
se deu esse trabalho, para que vocês possam ter uma base de
trabalhos dessa natureza; quem contatar e principalmente espalhar a
palavra. Então antes de tudo vamos começar pela história.
Há essa colega/vizinha/amiga/orientadora/... chamada Fernanda Simões que é do Mestrado de Arqueologia aqui em Sergipe. E ela convidou a mim e minha mulher (que também estuda Arqueologia) para participar de um trabalho de Arqueologia Pública realizado pelo Museu de Arqueologia de Xingó (MAX). O trabalho seria o seguinte: nós iriamos ao colégio acima citado e faríamos uma apresentação sobre o que é Arqueologia, suas áreas (ao menos aqueles que achamos de maior relevância) e falamos em especial sobre pré-história, já que esse é um tema de interesse, e que normalmente há uma defasagem no ensino e que nós como arqueólogos dominamos este assunto um pouco melhor que por exemplo um professor de história em sua maioria (estou generalizando aqui).
A IDEIA
Antes de realizar a
apresentação debatemos sobre como seria esta. Primeiramente
Fernanda já havia realizado ações educativas antes com Luiz Felipe
Freire, outro ex-aluno aqui de Sergipe em seu grupo de Arqueologia
Pública da faculdade, e já tinha um material pronto. Discutimos a
faixa etária em questão seria o sexto ano (antiga quinta série) o
que era ideal por que no primeiro semestre eles começam antes de
adentrar na história a estudar pré-história. O ideal era falar com
eles com uma linguagem um pouco mais científica e por tanto mais
madura, porém sem perder a irreverência caso contrário perderíamos
o publico também. Outra coisa que ficou clara é que ao nos
referirmos aos grupos indígenas usamos o termo “nossos ancestrais”
(ex: nossos ancestrais indígenas é que produziram essas maravilhas
que vocês estão vendo.) numa demonstração clara da valorização
destes e de grupos presentes na nossa sociedade. Creio que acima de
tudo nosso ideal era desmistificar várias ideias, ou melhor,
esclarecer o que é, do que se trabalha, como vive o arqueólogo e assuntos
relacionados a Arqueologia e pré-história.
Foto Cortesia do MAX. |
O MATERIAL E AS
IMPRESSÕES
Como era esse material?
Bom... Ele começa com
uma pergunta: O que é Arqueologia? A ideia era fazer a criançada
pensar um pouco e claro vinham respostas como dinossauros, aventuras,
que cercam o imaginário de várias pessoas. E para nossa surpresa
algumas poucas sabiam o que era e conseguiram colocar isso de forma
bem clara em especial uma menina de óculos brancos a nossa direita.
Dai mostramos algumas figuras que continham diversos aspectos clichés
sobre nossa profissão personagens de filmes, games, animação,
dinossauros etc. Seguida da seguinte frase “Isto não é
Arqueologia” partindo para explicar o que é Arqueologia. Deixar
claro que eles eram ótimos a reação deles era muito boa. Era como
se finalmente algumas das coisas que estavam sendo ensinadas em aula
fizessem sentido a partir deste ponto.
Começamos a falar como trabalha o arqueólogo, onde trabalha. Falamos também
sobre a divisão de pré-história e história aqui no Brasil a
partir de uma perspectiva mais clássica do assunto. E sobre
Arqueologia Brasileira. Das diversas áreas da Arqueologia como;
Arqueologia Pré-Histórica, Histórica, Ambientes Aquáticos (grande
interesse em como se escreve em baixo d'água), da Arquitetura,
Bioarqueologia (falamos de Luzia o que intrigou muito a eles), Arte
Rupestre e Sambaqui. Depois passamos a mostrar sobre trabalhos
realizado em Sergipe numa ideia de reconhecimento de como tudo o que
eles estão vendo na apresentação também acontece onde eles moram.
No final Fernanda
lascou uma “pedra” na frente deles e mostramos alguns líticos
produzidos numa oficina de líticos realizada em Laranjeiras no
intuito de mostrar algo mais prático para eles.
Foto Cortesia MAX |
APRESENTAÇÃO E MAIS
IDEIAS
Tudo na apresentação
tinha como foco interessar, estimular e principalmente desmistificar
algumas visões que as pessoas tem sobre Arqueologia e Sociedade sem
necessariamente falarmos disso. Então a linguagem tinha que ser
apropriada, não podia ser algo chato nem com cara de “Blues Clues
ou Teletubbies”. Afinal o publico é infantojuvenil então todo
cuidado é pouco. Tudo foi bem dinâmico e tudo que perguntávamos
eles responderam. Também exploramos muitos exemplos visuais na
apresentação pouco texto até para explicar alguma coisa usamos
muito “vamos imaginar...” para que tudo ficasse bem claro e não
houvesse sombra de dúvidas a eles.
A M.I.S.S.Ã.O.
O post está aqui para
poder trocar uma ideia com vocês, mas principalmente demonstrar como
que com boa vontade e recursos quase zero qualquer aluno ou grupo de
alunos, profissionais, podem fazer um trabalho desses, só é necessário boa vontade e um
pouco de “cara de pau”. Lembrem-se que, se nós nos incomodamos
com certas visões que as pessoas tem sobre a Arqueologia é
responsabilidade nossa educar a população sobre o assunto. Somente
a partir de medidas educativas, principalmente as que mexem com a
base é que mudaremos certas perspectivas e panoramas aqui no Brasil.
Não podemos deixar esse papel único e exclusivamente para as mídias
de grandes massas que em sua parte muitas vezes também não entende
muito sobre o assunto.
Ao afinal tivemos uma
reunião com Geovânia Carvalho a coordenadora da parte pedagógica do MAX e fomos convidados para o nosso
próximo desafio. Fazer uma feira sobre Arqueologia em um Colégio
Público. Assim que acontecer postarei está experiência para que
vocês possam tentar realizar com o seu grupo. E por favor se você
tiver alguma ideia crítica ou quiser dividir alguma experiência com
a gente nos escreva para paraarkeologos@gmail.com
Algumas palavras sobre
Arqueologia Publica e sua importância por Fernanda Simões.
Cortesia Fernanda Simões. |
Agradeço o espaço fornecido pelo Thobias e
inicio minha fala declarando que não acompanho as discussões
acadêmicas recentes sobre Arqueologia Pública e como não venho de
uma formação em licenciatura meus comentários podem soar
desatualizados para os entusiastas desse viés da Academia.
Entretanto, minha contribuição vem dos trabalhos práticos que
realizei através do Grupo de Arqueologia Pública (criado por alunos
da UFS em 2011) e na Ação Educativa do MAX, nesse episódio
específico.
Para entender as problemáticas que envolvem a
realização de uma Arqueologia Pública é necessário relembrar o
contexto das exigências que o Governo faz aos Arqueólogos, onde a
Portaria 007/88 exige que utilizemos o material produzido de uma
pesquisa arqueológica para “fins científicos, culturais e
educacionais”. Alguns arqueólogos que trabalham com o
licenciamento ambiental devem seguir as normas do IPHAN e realizam
pequenas atividades de Educação Patrimonial em diferentes grupos
(escolas, associação de moradores, sindicatos, igrejas, etc.).
Essas atividades de Educação Patrimonial são resumidas em
palestras curtas e pontuais, com o único objetivo de atender as
exigências legais.
Nesse ponto vemos a diferença da Arqueologia
Pública e da Educação Patrimonial realizada no Brasil. A Educação
Patrimonial realizada em contextos de Arqueologia Preventiva tende a
ser pontual, curta, superficial, imposta e surda. Alguns
pesquisadores até questionam o uso do termo “educação” para as
atividades ligadas a Arqueologia, pois remete a uma relação entre
um indivíduo que detém o conhecimento e outro indivíduo que não o
possui.
Ao lidar com Patrimônio Cultural, assumir que
qualquer grupo tenha conhecimento nulo sobre a temática é absurdo!
É a mesma coisa que dizer que uma pessoa de fora saberá mais sobre
uma determinada região do que os próprios moradores, ou seja,
podemos considerar essa abordagem como colonialista.
Então, a pesquisa de um arqueólogo não tem
validade, já que o morador de uma área sabe mais sobre ela do que o
pesquisador de fora? Não é isso, nem 8 nem 80! Os arqueólogos
estudaram para interpretar as sociedades através da cultura material
em diferentes contextos e as pessoas que estão inseridas nesses
contextos possuem muito conhecimento que virá a construir essa
interpretação. Cabe ao arqueólogo ser o responsável por
selecionar os discursos para a interpretação do contexto. Assume
então a perspectiva de mediador e não de professor.
A Arqueologia Pública traz sua contribuição em
atividades expansivas, questionadoras, reflexivas, sustentáveis,
etc. O principal ponto está em dialogar com os discursos produzidos
por determinado grupo na construção interpretativa.
Para realizar um trabalho de Arqueologia Pública
é necessário estabelecer os meios de comunicação entre o
pesquisador e a comunidade. Esses meios de comunicação são
extremamente variados, podendo ir desde inclusão de pessoas da
comunidade nas atividades realizadas, entrevistas, etc. Nesse caso
específico, a Ação Educativa proposta pelo MAX surge como etapa
inicial para realizar uma Arqueologia Pública, onde toda a Ação
foi orientada pelo feedback dos alunos de acordo com os inúmeros
questionamentos que recebiam.
As atividades realizadas no Colégio Aplicação
basearam-se principalmente em duas propostas: (1) entender que o
conhecimento que o público-alvo já possui é válido e necessário;
(2) refletir sobre os preconceitos associados a Arqueologia e a
Pré-história.
Os preconceitos foram trabalhados por toda a ação,
desde a diferenciação entre Arqueologia e Paleontologia até uma
discussão sobre “quem confeccionava as ferramentas de pedra na
pré-história, homens ou mulheres?” A resposta foi quase unânime:
Homens.
Essa resposta veio acompanhada de muita surpresa
ao me presenciarem retirar uma lasca de sílex no momento. Aos
leitores que não sabiam disso, eu declaro: Sim, mulheres também
podem fazer ferramentas líticas! Ao fundo passávamos um vídeo com
colegas da UFS realizando lascamento experimental (as pessoas no
vídeo eram Virgílio Júnior, Íris Marques, Fábio Telles, Pedro
Leonardo Almeida, Luis Felipe Freire e eu).
Como as ações educativas do MAX correspondem a
uma nova proposta de se trabalhar Arqueologia e Sociedade, realizamos
o primeiro passo ao estabelecer uma linguagem comum entre arqueólogos
e público-alvo. Esse primeiro passo será disseminado entre
diferentes públicos e então partiremos para a etapa seguinte: a
organização de uma feira de Arqueologia.
Contamos com a sugestão de todos nessa nova
empreitada.
Fernanda Simões.
FIM
Obrigado você Fernanda. Acho que mesmo não acompanhando tais discussões creio que qualquer um pode concordar com muito do que foi dito. Então gente espero que tenham gostando de mais essa. Parabéns Fernanda pelo excelente trabalho saiba que aqui no Para Arkeólogos você sempre tem espaço garantido.
Valeu galera! Agora mãos a obra.
Para Arkeólogos